quarta-feira, 25 de novembro de 2020

Erva daninha

A semente da solidão 

tá apodrecendo meu solo.

Bocejo

amanhã chega

manhã chega

a manha chega

Bozinha

Às vezes, 

por bondade,  

minto quando sou sincera, 

porque a verdade é afiada demais.

terça-feira, 24 de novembro de 2020

Texto de mortalidade

 Estou viva quando ainda não morri.

Incompatível

Quero fazer tanto, que me faltam vidas.

Gira-gira

Se a vida é feita de ciclos, 

qual é a hora certa pra pular do carrossel? 


Libertar

Nas palavras é onde estão guardadas 

as chaves das minhas algemas.

Assombrar

As palavras não ditas 

se transformam em fantasmas 

que sussurram aos ouvidos 

de quem às matou.

Modéstia ou fracasso?

De tudo o que eu já vivi, 

posso dizer que o que eu sei da vida 

é que se engolir caroço de fruta 

não nasce um pé na barriga.

Ar

 Quando me inspiro,

 respiro.

Fuga


 Quando bate na porta o medo da morte, 

eu me mudo pra caverna.

domingo, 22 de novembro de 2020

Universo paralelo


Acesse tuas lembranças e escolha uma das histórias que viveu. 

Agora, percorra o caminho em direção à ação original que desencadeou toda a situação. 

O que será que teria acontecido se você não tivesse ligado? Se não tivesse saído naquele dia? Se tivesse escolhido a pessoa errada? Se não tivesse com medo? Se tivesse sido sincero? Se tivesse escolha? O que ocorreria no teu universo paralelo?

sábado, 21 de novembro de 2020

O casal do semáforo




Da janela da praça de alimentação do shopping, vejo algo lá fora, mais precisamente ao lado da sinaleira: um grupo de trabalhadores de rua (eu na minha bolha, não sei nem como chamar a sua função). Tento manter minha leitura do Memorial do Convento (José Saramago), mas tal ato torna-se impossível competindo com o encanto daquelas pessoas. Eu sempre fui aficionada pelo seres humanos e por observá-los, por isso fiquei quase duas horas investigando aqueles jovens. Alguns podiam ter minha idade, mas nenhum chegava aos trinta. 

Me perguntei: quando teriam decidido se tornarem artistas de rua? 

Dali algum tempo, o grupo se dispersou, permanecendo no meu raio de visão apenas um casal de malabaristas. Pude perceber que ela, ruiva com moicano de dreads, estava iniciando nesse caminho, pois seu companheiro dava-lhe lições e mostrava como ela deveria fazer. 

Eles transpiravam liberdade. Eu não conseguia tirar os olhos daqueles dois. 

Durante todo o tempo em que fiquei obcecada por eles, ao passarem em meio aos carros, não ganharam nenhum centavo e quando o sinal abria, eles voltavam para a calçada e se beijavam, se abraçavam, sem nenhum sinal de frustração. Em seguida, eles emendavam um treino. 

Eles faziam um malabarismo entrelaçado, eles estavam livremente emaranhados. 

Eles davam beijos um no ombro do outro. Eles riam muito, eram extremamente tranquilos. Eles erravam muitas vezes aqueles números que ensaiavam e estava tudo bem. E muitas vezes a sinaleira fechou e eles não se apresentaram, porque eles não tinham pressa, eles não tinham ganância.

terça-feira, 10 de novembro de 2020

Meus diários

Dos meus 11 aos 16 anos eu tive agenda, mas eu utilizava como diário mesmo. Eu guardo tudo até hoje e me pergunto "por quê?", "pra quê?", mas eu não sei a resposta...

Talvez seja pra ver como eu era ou servem como uma prova pro mundo de que eu cresci.

Talvez seja pra eu "tocar" todas as minhas memórias.

Talvez seja para eu guardar parte da minha adolescência, numa escancarada síndrome de Peter Pan.

Talvez seja pra matar a saudade daquele tempo.

Talvez seja pra manter intacto um mundo colorido que eu construí, baseado na crua realidade da vida.

Talvez seja pra eu me lembrar de quem eu fui e quem eu quero ser.

Talvez não precise ter motivo, só existir.



A distância que aproxima

Quanto mais me distancio do que vivi um dia, mais posso lembrar e escrever sobre. Mesmo sabendo que nossas lembranças não passam de uma ficção barata produzida pela nossa mente, não posso deixar de confirmar que, indiscutivelmente, são histórias baseadas em fatos.

Memórias

O que somos nós se não nossas memórias? Se o que me sustenta hoje é o que eu vivi ontem? 

Então, de que adianta pôr as fotos e as cartas fora, se ainda tenho um monte de tudo o que passou em/por mim?


Insônia

O problema em crescer é que quando a gente tem insônia, não tem pra quem ligar. O primeiro motivo é que teus 600 amigos se reduziram a seis. O segundo é que eles também cresceram e precisam trabalhar no dia seguinte. 

Acho que acabei de me dar conta de que possuo mais uma evidência de que estou envelhecendo: solidão.